Daí você acorda três horas da manhã. Lá
fora um silêncio modesto. Sinto sede. Queria um cigarro. Levando da cama e vou
até a janela. Olho para a cama vazia: você não está. Quanto tempo faz? Não sei.
Não consigo determinar certas mudanças na minha vida. A solidão como tema principal das minhas
queixas é coisa recente entre os amigos, mas não sei quanto tempo faz. Nunca
toco no seu nome, mas todos sabem minha verdadeira aflição. Queria um cigarro
nessa solidão. Volto para a cama, procuro um livro na cabeceira: tem uma bíblia
pequena que eu ganhei de um amigo protestante. Será que a história está
resumida? Tem outro livro, que eu parei na metade. Uma revista sobre
celebridades. A revista é herança sua.
O livro?
Vou até a cozinha. Não estou com fome, mas
também não estava com sono. Poderia trocar a pizza gelada por uma noite bem
dormida? Sinto sua falta, Juliana, mas não quero dizer isso para ninguém.
Escreveria um livro sobre minha mal escrita relação com você? Talvez mereçamos
essa consideração. Um pedaço de pizza, um copo de água gelada. Quanto tempo eu
não durmo direito? Vou até a sala, procuro algum filme interessante na estante:
“Terceiro Tiro”, “Paciente Inglês” e “Zabriskie Point”. Confesso que não tive
coragem de ficar com você, enquanto você assistia aos filmes. Dormi antes dos
dez minutos. Sabe? Naquela época eu trabalhava muito, descansava pouco. Dormir
em seus braços era uma coisa que me deixava vivo.
Somos antagônicos, muito diferentes. Mas
ambos, hoje, tão igualmente solitários. Queria te ligar, mas você não vai me
atender. Quer saber? Concordo que realmente o remédio é o tempo. Não que eu
tenha qualquer esperança que voltaremos a formar um casal feliz. Esse negócio
de tempo é uma grande bobagem, na maioria das vezes. Entendo; muitas vezes esse
afastamento serve para colocar a cabeça no lugar, mas é terrível quando
desalinha também o coração. No sofá da
sala, sem sono e sem fome; nada na televisão: nesse momento penso em você, mas
penso diferente. Você não é mais aquela pessoa que eu amava, e qualquer coisa que fizéssemos agora; seria
um recomeçar do zero, um renascimento, que poderia vingar ou não. Seria como se
fosse ter que apreender amar você novamente.
Quer saber? Acho que você está acordada
pensando a mesma coisa que eu. Levanto do sofá, corajosamente. Você na cama
ainda acordada. Você me viu cheio de febre, fome e abstinência? Odeio saber que
você está ai, como se não estivesse. Vamos nos ajeitar? Senão vou embora para
sempre. Eu seguro o seu ombro, olhamos um para o outro. Odeio quando você
chora, odeio quando eu não consigo chorar. O que fizemos de nossas vidas? Onde
estão nossos sonhos? Nossos sonhos são
tão distantes? Queria alguém para me acompanhar, quer alguém para assistir um
misero filme. Vamos dormir? Eu te abraço, mas não consigo dormir.
De manhã: a vida como nunca. Tudo muito
igual. Saímos juntos para o trabalho. Fico no meio do caminho, você segue
adiante. Vamos almoçar juntos hoje? Eu não posso, tenho uma reunião; você não
pode, tem uma desculpa tão real quanto a minha. Nós nos evitamos. Mas isso é
fácil, de dia; quando nossa cabeça está cheia de problemas, resoluções e
números. É fácil quando estamos com outras pessoas, pensando em outras coisas. Mas
quando estamos juntos? Quando no quarto, você decide apagar a luz do abajur e
não diz uma única palavra?
Ia perguntar se você tinha um cigarro, mas
estamos longe novamente.
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