Ando de metrô frequentemente. Todos os dias: faça chuva ou
sol. Nessas minhas andanças já vi de tudo, ou quase tudo. Pois bem, um fato tem
chamado minha atenção. A idéia de que o mundo anda mesmo mudado. Homens e
mulheres, juntos e separados. Por agora pretendo apenas falar do assunto de
forma simplista, homem e mulher como conhecemos há milênios. Sei lá, deve haver
homossexualidade desde os primórdios, mas não sei muito sobre esse assunto.
Assim, por mais que eu queira falar sobre todas as relações amorosas possíveis
e imagináveis, meu mundo e minha visão e (imaginação) ainda é heterossexual.
Básico, majoritário e histórico.
E na relação entre homens e mulheres, propriamente dita;
as coisas também andam se invertendo. Já deixei meu recado aqui para os homens
alfa e os betas. Sentimental, rude; machista e feminista. Os homens se
transformaram de acordo com a demanda. As mulheres queriam homens mais
participativos em atividades que antes eram consideraras “coisas de mulher”.
Não existe mais isso: balela ultrapassada. Homem passa a camisa, lava a louça e
leva o filho para escola. Não todos; é claro. Mas uma grande parte. Homem chora
com novela, se emociona com uma música de filme de comédia romântica e vibra
com o herói ou a heroína de qualquer história. As novelas, companheiras de
nossas avós, hoje são comentadas por marmanjos barbados nos botecos (hoje é
maneira de dizer, esse fato já é bem conhecido dos sociólogos há décadas).
Enfim, voltemos ao metrô.
Estava eu tirando aquele cochilo da tarde dentro do metrô.
A viajem é longa, dá para sonhar. O som do metrô também é propício para uma soneca. De repente eu vejo
chegando um casal. Eram casados. Sentam-se lado a lado. Conversam alguma coisa,
o homem ri. Ficam em silêncio alguns minutos. Ele pega um livro e abre, ela faz
a mesma coisa. Eu sou muito curioso sobre a literatura alheia. Sempre que posso
dou uma bisbilhotada em algum parágrafo, título e autor. Nesse caso pude ver
apenas a capa. O que ela estaria lendo? Zíbia? Mulheres adoram Zíbia. A Guerra
dos Tronos? Outra adoração feminina. E ele? A biografia de Steve Jobs? Ou coisa do gênero? Que nada: ela estava com Tropa de Elite e ele Ame o que é seu. Não estudo teoria literária, tampouco teoria
dos leitores, mas algo ali me pareceu muito esquisito.
Teriam trocado o livro sem perceber? A sonhadora mulher
estaria lendo o livro que estava na mão dele, o realista homem lendo o que
estava com ela? Homens são sanguinários e violentos ainda? Mulheres são
sonhadoras? Meus parâmetros se perderam, eu acho. No mundo de hoje, o que
parece tão normal para uns é conversa fiada de conservadores para outros. Não
sou nenhum conservador, mas parei no tempo dessa história. Homens e suas
características se foram, assim como as características das mulheres. E se
pensarmos num prognóstico para o futuro, existe uma forte tendência para o
erro. O ser humano continua sendo um ser imprevisível.
Não sei se é uma tendência. Talvez seja uma marca de nosso
tempo. Homens e mulheres em atividades tão próximas: a rudez de um motorista de
caminhão e a leveza de um fisioterapeuta. O que antes tinha uma demarcação no
tempo e espaço, como sendo coisa de mulher; hoje flutua no cotidiano masculino:
Leve, livre e solto. Por outro lado, as cercas de um terreno lamacento, como
sendo coisas de homem; hoje recebe pequena semente florida das mulheres. Ainda temos limites do meridiano “coisa de
homem” e “coisa de mulher”, mas diferente de outras épocas, há cada vez mais um
intercâmbio entre os lados opostos, num grande e variável onda de gestos,
gostos e ações. Ser homem e ser mulher não está mais determinado por critérios
tão pequenos do cotidiano, mas por disposição afetiva, sexual ou conchinha no
sono numa noite fria.
Chegamos à estação onde eles deveriam descer. Ela se
levanta primeiro, ele acompanha. Mais do que a literatura como indicador
daquele casal, determinadas ações também mostram quem realmente manda. E
diferente do que nós, homens, imaginávamos; a mulher sempre mandou na relação.
O problema é que agora elas não fazem a menor questão de
esconder isso.