sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Quando a gente não pode dizer não- Por Fernando Esteves

Estar desempregado, por vezes, é uma experiência única. Saber que a programação da TV, no horário da manhã, continua a mesma porcaria, descobrir que seu vizinho consegue fazer mais barulho que o cara que fica no balcão enchendo o saco de todo mundo. Agora, o problema é quando sua mulher percebe que você está ali, sem muito o que fazer, sem poder reclamar de um dia cansativo, pois até ali não fiz nada e, numa única frase fulminante, diz: " Vamos dar uma chegada na 25??". Não há como negar um pedido feito de forma tão doce, mesmo porque, negar esse pedido pode ter consequências muito graves no futuro. Da aventura de achar um local para estacionar, que não precise deixar o carro como pagamento, de tão caro, até conseguir acompanhar minha mulher no meio de tanta gente ( as vezes tenho a impressão que ela, antes de ir até lá, ensaia com todos para que eles não se esbarrem e eu, claro, não participei desse ensaio ), onde um te oferece um relógio, outro passa um aparelho de massagem nas costas das meninas, sem saber que, por total carência, são os rapazes que gostam disso e, o grande clímax, um rapaz oferecendo a camisa do Sheik, "o viadinho do corinthians", detalhe, deiz real. Já havia muito tempo que não passava por essa experiência e, a cada saída, fico me perguntando como ela consegue entrar em cada loja, olhar tudo, perguntar por algumas coisas e, no final, não levar nada. Enfim, o ócio de não trabalhar é muito chato, mas passar alguns momentos com minha mulher, num mundo que é dela, e senti-la feliz por isso, não tem preço.

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Saudade, saúde e outras reclamações.



Hoje é dia de festa. Mas, bem, estou sozinho. Sentado, vendo a televisão. Eu me levanto, às vezes, para caminhar pela sala. Não há programação para os solitários, apenas falatório. Novela, telejornal e jogo de futebol. Não preciso prestar atenção em nada, não me dizem nada. Não preciso de dinheiro, nem de conselhos; mas preciso de você, um pouco. Preciso nem que seja uma ligação, um comentário qualquer; um recado. Hoje é dia de festa, seria dia de festa se não estivesse faltando tantas coisas. Senão é tédio. E eu, que gosto de você, ainda; o que direi aos meus dias daqui para frente?

O meu futuro repleto, os meus dias cheios e minha paciência embora.

Tenho algumas reclamações piores sobre a vida, mas hoje prefiro me manter tão sereno quanto inaudível. Sabe?  Resmungando para mim, bem baixo e indecifrável som. Mulheres odeiam homens reclamando, vice-versa. Mas nós suportamos melhor uma mulher reclamando. Amamos mesmo assim. E eu, que tão diferente de mim mesmo nos últimos anos, talvez, por relapso; não tenha conseguido te agradar. Por que foge? Ora. Não preciso de resposta, mas preciso de solução. Eu sei, vai chegar uma pessoa, daqui a pouco, vai bater na porta; mas não é a pessoa que eu amo. Amor é complicado. Mulheres odeiam homens que reclamam do amor. Homem que ama muito é homem com problema sério. Mas, diferente do que possam querer, ou imaginar; já me adianto: não amo. Eu apenas amo amar; amo sofrer quando posso; amo a saudade de um grande e injustificável amor. Amo ter saúde para reclamar do amor. Amo suas reclamações.

Coisa minha, não serve para o gênero.

Mas, de repente, a porta abre. E aquela pessoa que eu não amo, ou que penso não amar; vai ser o amor da minha vida. Daqui e em poucos instantes. Até a hora que não for mais. Amor instantâneo e prático. Até a hora que sair pela porta dizendo que nunca mais vai voltar. Não vá embora! Penso com sofreguidão, penso na solidão; penso na festa. Eu me adiantando a tudo que pode acontecer. E quando for embora, vou sentir a mesma saudade; o mesmo amor; e dar a mesma explicação absurda para meus sentimentos. Amo no sentido completo, mítico. Amo não uma pessoa, uma mulher de cabelos longos ou curtos; amo as mulheres, em geral. Todas. Que me deixaram ou não. Amo as mulheres como agora te amo, creia em minhas palavras.

Ela joga o presente no chão. Não que tenha sido caro, mas no momento foi um desperdício.  Mulheres não adoram presentes, elas adoram a situação em que estão recebendo o presente. Mulheres são menos materialistas do que podemos imaginar. Mulher ama o dinheiro quando traz o sossego, a explicação para a vida e o conforto. Mas não ama alguém por dinheiro, ama por conforto e segurança. Não estou falando de todas as mulheres, mas aquelas com quem me relacionei. Bobagem. É uma tremenda bobagem pensar que as mulheres só pensam no dinheiro. Ela pega o presente no chão, arrependida. Eu seguro seus braços: “Vamos assistir a um filme? Comer alguma coisa? Você está nervosa. Não acredite em tudo que dizem sobre mim”.

Eu sei que ela vai embora daqui a pouco.

Hoje seria nossa festa. Dois se abraçando, se beijando com a música. Não é preciso muito para qualquer diversão. Quando há amor, a festa é imune ao marasmo, ao silêncio e a embriagues. Nós bebemos mais do que podíamos, e eu sei que ela vai embora. Festa: eu me sinto bem sozinho, essa televisão ligada; o amor incondicional. Amo todas as mulheres, mas o amor de apenas uma: aquela que está comigo. É preciso ser tão ilógico quando se fala sobre o amor? Menti em alguns momentos, mas não podia ter mentido agora: hoje era dia de festa. Acabou sendo uma briga. Idiota, sem sentido. Imperdível, dizem os vizinhos.

Não estarei mais quando a campainha tocar por duas ou três vezes.